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quinta-feira, 8 de julho de 2010

#3 - Llevar sus cosas con suspensión

A culpa pelo atraso entre o último post e este é toda minha. Mas hey, nada como um atraso de duas semanas para estabelecer o tom para uma discussão da beleza de manter as pessoas em suspense.
Llevar sus cosas con suspención
La admiración de la novedad es estimación de los aciertos. El jugar a juego descubierto ni es de utilidad ni de gusto. El no declararse luego suspende, y más donde la sublimidad del empleo da objeto a la universal expectación; amaga misterio en todo, y con su misma arcanidad provoca la veneración. Aun en el darse a entender se ha de huir la llaneza, así como ni en el trato se ha de permitir el interior a todos. Es el recatado silencio sagrado de la cordura. La resolución declarada nunca fue estimada; antes se permite a la censura, y si saliere azar, será dos veces infeliz. Imítese, pues, el proceder divino para hacer estar a la mira y al desvelo.
O gênio de Gracián é a facilidade com a qual ele liga os diferentes significados de suspensión. É o ato de suspender a ação até que chegue o momento perfeito; é o suspense resultante, que faz todos perguntarem o que está acontecendo; é o delicioso frisson da "universal expectación", de "la admiriación da la novedad". O objetivo não é apenas manter as pessoas em suspense quanto aos seus objetivos, mas mantê-las em suspense quanto ao suspense; quanto mais raras forem as revelações, maior será o interesse por elas.

Mas é a última frase que atraiu minha atenção: manter as pessoas em suspense, deliberadamente ofuscando seus propósitos e despistando-as com respostas difíceis de compreender seria simplesmente a imitação do proceder divino. E Gracián talvez não está errado ao atribuir a Deus esta mistificação deliberada de seus propósitos. Gracián pode estar se referindo à platitude generalista de que os caminhos de Deus são misteriosos; mas o aforismo pode ter algo a ver com a resposta de Jesus aos seus discípulos, quando eles perguntaram por que ele ensinava através de parábolas:
"Porque a vós é dado conhecer os mistérios do reino dos céus, mas a eles não lhes é dado; pois ao que tem, dar-se-lhe-á, e terá em abundância; mas ao que não tem, até aquilo que tem lhe será tirado. Por isso lhes falo por parábolas; porque eles, vendo, não vêem; e ouvindo, não ouvem nem entendem. E neles se cumpre a profecia de Isaías, que diz: Ouvindo, ouvireis, e de maneira alguma entendereis; e, vendo, vereis, e de maneira alguma percebereis. Porque o coração deste povo se endureceu, e com os ouvidos ouviram tardamente, e fecharam os olhos, para que não vejam com os olhos, nem ouçam com os ouvidos, nem entendam com o coração, nem se convertam, e eu os cure. Mas bem-aventurados os vossos olhos, porque vêem, e os vossos ouvidos, porque ouvem."
(Mt 13: 11-15)
Ocasionalmente pastores e escritores ensinam que as parábolas eram maravilhosos instrumentos didáticos de Jesus, que facilitavam a compreensão de seus ensinos ao colocar princípios espirituais em termos do cotidiano. Mas uma leitura superficial dos evangelhos já revela que muitas vezes os próprios discípulos não faziam idéia do significado das parábolas, e o próprio Jesus aqui revela que sua intenção real é exatamente o oposto daquela que é atribuída a ele: as parábolas existem não para esclarecer, mas para confundir. Aqueles que devem entender, entenderão; aqueles que não devem, não entenderão.

É claro que não podemos ir longe demais nesta leitura conjunta de Mateus e Gracián. Os motivos pelos quais Gracián recomenda a discreção — o medo de ser criticado caso seus planos não dêem certo, a prudência de manter em segredo suas intenções, o simples bom gosto de jogar sem mostras suas cartas — são, presumo, diferentes das intenções de Jesus, que insiste em manter sua mensagem do Reino de Deus um mistério para que se cumpram as profecias de Isaías, para que o juízo e a ira de Deus se manifestem. Mas é interessante notar que no momento em que Jesus abertamente revela suas intenções — quando ele se proclama a ressurreição e a vida, e levanta um homem do túmulo; quando ele entra em Jerusalém montado num burrinho, deliberadamente encenando a profecia de Zacarias, de que Jerusalém viria seu Rei chegando a ela "humilde e montado sobre um jumento" — no momento em que Jesus publicamente revela quem ele pensa que é, os líderes políticos e religiosos da nação prontamente o prendem, julgam e crucificam.

Então quem sabe o conselho de Gracián aqui é útil afinal.

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